"Há quatro anos, grileiros se revezam para nos ameaçar, queimar barracos, destruir plantações e fazer armadilhas. As pessoas passam mal, outras estão ficando depressivas e eu tive um princípio de AVC devido aos conflitos. Trabalhamos apenas para ter prejuízo", desabafou a produtora rural Marta Valéria, que, junto com 80 famílias, vive na Vicinal dos Pampas, dentro da Gleba PDA Anauá, na região de Novo Paraíso, em Caracaraí.
Ela conta que, ao longo dos anos, grileiros entram na Justiça para ocupar a região, local onde essas famílias moram e tiram o próprio sustento. Durante o processo, impõem medo por meio de represálias. Por isso, os moradores pedem providências das autoridades para garantir segurança jurídica e pessoal. Em 2024, por exemplo, os criminosos queimaram 22 barracos e forçaram os moradores a incendiar seus próprios pertences.
Este cenário se repete em diversas regiões do estado, onde milhares de produtores rurais e moradores são assolados pelo crime de grilagem de terras.
A denúncia foi apresentada na primeira reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Terras da ALE-RR, realizada na tarde desta segunda-feira (24), em frente à Câmara Municipal de Rorainópolis, reunindo mais de 300 pessoas.
O encontro foi solicitado pelo presidente da Câmara, vereador Márcio Alves de Sousa (PP), após moradores denunciarem crimes de grilagem na vicinal Zé Evaldo, além de prejuízos financeiros e ameaças de morte.
Diante da gravidade da situação e do apelo popular, a CPI, criada em 20 de fevereiro para investigar denúncias sobre a existência de uma organização criminosa voltada à apropriação ilegal de terras públicas e privadas no Estado, promoveu essa primeira ação em Rorainópolis, reunindo também moradores de Caroebe, São João da Baliza e São Luiz do Anauá.
O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Soldado Sampaio (Republicanos), que integra a CPI, enfatizou que as investigações serão rigorosas.
"São relatos graves de tortura, ameaça, queima de casas e denúncias concretas de grilagem. Precisamos apurar com responsabilidade, sem perder o foco, e saber até que ponto o poder público está apoiando e compactuando com essa prática em áreas habitadas", destacou.
Ele garantiu que os responsáveis serão identificados e responsabilizados. "As denúncias serão investigadas e os indiciamentos necessários serão feitos para punir quem está agindo de forma desonesta, utilizando poder econômico e político para se apropriar de terras de maneira indevida", reforçou.
Outros relatos
Também presente na reunião, o agricultor Elias José da Silva relatou as dificuldades enfrentadas pelos produtores rurais.
"Os grileiros fazem o que querem: destroem nossas plantações, passam tratores por cima, incendeiam nossos barracos, prendem pessoas, confiscam ferramentas e causam o maior caos. Tentamos recorrer às autoridades, mas parece que há gente influente apoiando os grileiros e indo contra nós. Estou aqui para denunciar tudo isso e pedir providências", disse.
Morador da vicinal Zé Evaldo, Carlos Aguima compartilha do mesmo drama. Desde 2015, ele e mais de 60 famílias vivem da agricultura na região, mas, em 2017, começaram a sofrer ameaças de invasores que reivindicam a posse das terras.
"Estamos lá desde 2015 e nunca ouvimos falar deles. Em 2017, tivemos uma reunião com o Incra, pois a terra pertencia ao órgão. Depois, foi transferida para o Iteraima, e, a partir daí, começaram a aparecer essas pessoas se dizendo proprietárias", relatou.
Ele pediu a regularização fundiária como única solução para encerrar os conflitos. "Vivemos inseguros, sem saber se a terra realmente será nossa ou se, a qualquer momento, poderemos ser despejados", afirmou.
Próximos passos
O presidente da CPI, deputado Jorge Everton (União), ressaltou que esta foi apenas a primeira etapa do trabalho da comissão, que seguirá apurando os fatos.
"Ouvimos a população, os produtores e agricultores que estão tendo seus direitos violados. Agora, reuniremos toda a documentação solicitada pelo relator Renato Silva e daremos início às diligências", explicou.
Everton destacou que a CPI usará tecnologia para mapear as áreas invadidas. "Muitas dessas terras precisarão ser inspecionadas com imagens de satélite para termos provas concretas", acrescentou.
A comissão seguirá com oitivas e investigações para identificar e responsabilizar os envolvidos.
CPI das Terras
A ALE-RR instaurou a CPI das Terras por meio do Ato da Presidência nº 003/2025, motivada por denúncia encaminhada pelo Ministério Público de Contas (MPC), que solicitou o afastamento da presidente do Iteraima, Dilma Lindalva Pereira da Costa, acusada de grilagem e favorecimento indevido na regularização fundiária da Gleba Baliza.
A CPI é composta pelos deputados Jorge Everton (União), como presidente; Armando Neto (PL), vice-presidente; Renato Silva (Podemos), relator; e os membros Marcinho Belota (PRTB), Chico Mozart (PRTB), Neto Loureiro (PMB) e o presidente da ALE-RR, Soldado Sampaio (Republicanos).
Canal de denúncias
Moradores que tenham denúncias sobre grilagem de terras podem entrar em contato com a CPI por meio do número (95) 98423-4691. As informações podem ser enviadas de forma anônima.
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