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Pacaraima, a fronteira onde a Igreja alarga sua tenda cada dia

Pacaraima é local onde a Igreja alarga sua tenda cada dia, se tornando casa de acolhida.

Pacaraima, a fronteira onde a Igreja alarga sua tenda cada dia
Foto: Cláudia Pereira
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Pacaraima, uma pequena cidade na fronteira com a Venezuela, era um local desconhecido, que se tornou manchete dos jornais com o início da migração venezuelana. A cidade mudou o rosto, em dez anos sua população dobrou, e hoje 50 por cento são venezuelanos. Pacaraima é local onde a Igreja alarga sua tenda cada dia, se tornando casa de acolhida, mas ao mesmo tempo lugar de diversas formas de exploração, com episódios que são claros exemplos das dificuldades que enfrentam os migrantes em muitos lugares do planeta.

Uma realidade de sofrimento e esperança

A missão que a Comissão Episcopal Especial para o Tráfico de Pessoas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), está realizando em Roraima, com visitas à Guiana e a Venezuela, permite conhecer uma realidade que encerra muitas macelas, situações de sofrimento que muitas vezes não aparecem, mas acontecem, provocando aflição em pessoas que carregam histórias de vidas feridas.

Em Pacaraima, uma cidade marcada pelas filas, por pessoas deambulando nas ruas, a acolhida é realizada pelo poder público, principalmente pelo exército brasileiro, por organismos internacionais e por diversas instituições, dentre elas a Igreja católica. São diversos os espaços de acolhida, destinados a diversos públicos, dentre eles povos indígenas, mulheres com crianças, famílias, idosos. O refúgio dos povos indígenas abriga cinco povos diferentes chegados da Venezuela, fugindo da fome, da violência, do garimpo e de muitas outras situações adversas. No Brasil eles querem constituir comunidades indígenas, onde os diversos povos possam reconduzir sua vida.

Foto: Cláudia Pereira   

 

A Igreja acompanha os migrantes

A Casa São José, abrigo para mulheres e crianças, foi criado em 2020 pelas Irmãs de São José de Chambery. As condições em que se encontravam as mulheres, que sofriam diversas formas de maltrato, exploração e tráfico de pessoas, levou as religiosas, sem nenhum recurso, nem ajuda, a iniciar uma verdadeira aventura. Aos poucos as ajudas chegaram, primeiro da Operação Acolhida do Governo Brasileiro, que até hoje fornece alimentação, e depois de muitas pessoas, de diversos lugares do Brasil e do mundo, sensibilizadas depois da invasão do abrigo em 2021. Um tempo de “muito sacrifício, muito choro”, diz nas lágrimas a religiosa que coordena o espaço, junto com voluntárias venezuelanas, que conhecem melhor a cultura das mulheres que lá chegam. Atualmente a passagem é mais rápida, no máximo um mês, no início algumas mulheres ficavam até seis meses, porque não tinham aonde ir.

As irmãs de São José de Chambery também acompanham a primeira associação de migrantes venezuelanos no Brasil no ramo da panificação, a Padaria São José, um sonho de ter pão em todas as mesas, de levar o pão às comunidades mais necessitadas, mais distantes de Pacaraima. Um sonho que foi iniciado no salão da paróquia e onde depois de dois anos trabalham sete pessoas, que tem seu espaço de atendimento, ajudando os venezuelanos que cada dia entram pela fronteira. Criar essa associação não foi fácil, mas o apoio da diocese de Roraima fez possível sua legalização.

Outros dois projetos da Igreja católica são o Projeto Porta Aberta, com capacidade para 50 pessoas, que acostumam ficar duas semanas, acolhendo aqueles que esperam a interiorização no Brasil. Oferece café da manhã, almoço e janta, e desde novembro de 2023 passaram mais de 120 famílias. Igualmente o projeto com idosos, que durante o dia oferece diversas atividades aos idosos, ambos projetos coordenados pelo padre Jesus Fernández de Bobadilla.

 

 

Indiferença diante da migração e o tráfico de pessoas

Dessa missão participam o bispo de Picos (PI) e membro da comissão, dom Plinio José Luz da Silva, que, diante do tráfico dos seres humanos, denuncia “a indiferença da sociedade, também da Igreja, em diversas regiões”. Diante disso, o bispo afirma que estamos diante de “algo que é escondido, mas que existe, e ele precisa ser considerado e combatido”. Um assunto que quando é falado, “não dá nenhum impacto, o pessoal não quer discutir sobre esse determinado assunto, entrar nos fatos”. Ele destaca que na própria CNBB não se fala nesse assunto, ele mesmo veio conhecer a comissão agora que foi convidado para fazer parte, “mas não tinha conhecimento desse trabalho que era feito”, sublinhando “o desconhecimento e por tanto desinteresse” sobre a temática.

Diante dessa realidade, “eu vejo a necessidade da divulgação para prevenir”. Do mesmo modo que outras realidades que tem a ver com os pobres e a injustiça social são debatidas pelas Pastorais Sociais, o bispo de Picos insiste na necessidade de divulgação, de que nos subsídios da CNBB para as diversas campanhas, seja contado a realidade, como acontece em Roraima, onde “as pessoas ficam vulneráveis diante da migração, as pessoas ficam desfavorecidas de todos os recursos”, o que faz com que as organizações criminosas encontrem a oportunidade para usar os migrantes como mercadoria.

Dom Plinio destaca a necessidade de a comissão conhecer a realidade para saber enfrentar os ataques à vida, essa chaga na vida das vítimas. Ele afirma que “esta missão, ela enriquece a gente com um conhecimento para que possa argumentar para a sociedade aquilo que a gente conhece”, o que demanda da comissão estar “permanentemente nessa investigação”, em vista de divulgar fatos nos meios de comunicação, o que ele considera fundamental, “as pessoas precisam tomar conhecimento do que está acontecendo e possam reconhecer em volta da realidade local, casos que são ocultos”.

Foto: Cláudia Pereira   

 

Defender a vida sempre

Como Igreja, “nós precisamos defender a vida, desde a sua concepção até o fim último”, como missão da Igreja, segundo o bispo. Ele destaca que “essa vida, ela está realmente envolta na realidade”, afirmando que “o maior sofrimento do povo é gerado por uma sociedade da indiferença, da divisão de valores, da falta de oportunidades de viver dignamente, principalmente os mais pobres, os mais vulneráveis, que são os primeiros a sentir esse impacto”. Ele denuncia iniciativas dentro da Igreja católica que “praticamente excluem de sua missão essa parte de olhar a pessoa como um todo, na sua dignidade”.

O bispo enfatiza que “há situações em que só a gente falar na palavra pobre, já são discriminadas por grupos religiosos que fazem seu trabalho na parte intimista”, algo aparece na linguagem que leva as pessoas a pedir, “para mim, para minha família, não se abre espaço para a fraternidade, para a solidariedade”. Diante disso, ele considera a Campanha da Fraternidade como “um exemplo positivo de que a Igreja realmente se preocupa com a pessoa como um todo, principalmente nesse momento em que ela fica vulnerável em seus direitos, sua dignidade”.

Histórias de vida, de pessoas acompanhadas pela Igreja, que escuta de forma atenta para poder identificar as dores, as violências, que ajuda os migrantes a conhecer seus direitos e as ameaças. Migrantes que na fronteira entre o Brasil e a Venezuela, muitos deles em condições muito precárias, em ocupações, muitas vezes lideradas por mulheres, que reconhecem e agradecem o apoio da Igreja católica.

 

FONTE/CRÉDITOS: Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
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