A Organização Mundial da Saúde classifica, atualmente, cerca de 20 doenças negligenciadas, como chagas, leishmaniose, hanseníase, dengue e raiva. Elas afetam cerca de dois bilhões de pessoas no mundo, sobretudo as marginalizadas. E, por isso, o professor do Instituto de Química da Unicamp, Universidade Estadual de Campinas, Luiz Carlos Dias, defende uma política de Estado voltada para o assunto.

“O Brasil, historicamente, nunca investiu em desenvolvimento de novos medicamentos. Muito menos pra essas doenças tropicais, que afetam populações negligenciadas, incluindo mulheres, crianças e populações indígenas. Pra enfrentar, precisa-se de liderança e de um esforço político e econômico conjunto. Nós precisamos de uma política de estado. Coisa que nós não temos”, aponta Dias.

O professor Luiz Carlos coordena o consórcio internacional com pesquisadores de outros países e entidades brasileiras, que unem forças para o desenvolvimento de remédios para as doenças em questão.

Segundo a financiadora de pesquisas FAPESP, a redução do financiamento público se agravou durante a pandemia. Para se ter uma ideia, de 2019 para 2020, o valor investido caiu 73%. Por outro lado, o especialista defende que de nada adianta ter financiamento, ter o produto pronto, se não há políticas públicas que façam tudo chegar na ponta, para quem realmente precisa.

“Não basta você ter o medicamento, você ter a vacina, você ter aquela alternativa terapêutica. Você precisa levar esse medicamento, essa vacina, até a ponta, até quem mais precisa. Inclusive levando diagnóstico. Tornando, assim, a cobertura universal de saúde uma realidade. Porque é preciso aliviar essa carga de doenças e é preciso abordar questões fundamentais. Isso é questão de direitos humanos: você levar o medicamento para quem precisa”, finaliza o professor.

O consórcio com pesquisadores internacionais envolve, no Brasil, a DNDI, iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas. A Coordenadora de pesquisa de fármacos da entidade, Luiza Reis explica que a ideia é garantir o acesso da população aos produtos desenvolvidos e capacitar, cada vez mais, os pesquisadores brasileiros.

“O processo de descoberta dos novos medicamentos é um processo muito demorado, oneroso, então trabalha com várias parcerias, no Brasil e em mundo, pra tentar trazer esses medicamentos pra população negligenciada. A indústria farmacêutica é muito forte no norte global. Um dos trabalhos da DNDI é justamente esse: construir uma rede de pesquisadores, uma rede de pesquisa, pra tentar descobrir, tentar melhorar a vida das pessoas, pra não depender só daquele salvador do norte global”, explica Luiza.

Este ano o Ministério da Saúde lançou a Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Entre os seis eixos previstos no projeto, está o Programa para Populações e Doenças Negligenciadas, com foco em tuberculose, dengue, esquistossomose e hanseníase. A ideia é estimular a produção de tecnologias de “prevenção, diagnóstico e tratamento” da população afetada.